#VemPraRua

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Joguei a mochila por cima do ombro e cobri o nariz e a boca com o pano untado de vinagre. 
- Corre! Corre! - Minha mochila agitava-se, causando um peso desconfortável, mas suportável. Um conjunto de cartazes e pessoas gritando misturavam-se com o vapor dos gases lacrimogênios. A minha trilha sonora eram os gritos xingando os policiais de covardes, a cantiga descompassada pedindo por uma manifestação sem violência, os gritos pedindo por ajuda, pessoas que haviam sido atingidas por balas de borracha, pessoas lutando contra os efeitos.
A minha frente, uma pessoa filmava tudo. Ela gritava para os futuros espectadores o que realmente acontecia, o que a mídia não mostraria, e se mostrasse, transformaria em algo nulo. Eu estava no meio da gravação, e não pude negar um sorriso. Talvez não por pensar "mãe, estou na tela", mas sim por imaginar meus filhos apontando para o livro de história "mãe, você estava lá?". No meio do medo de ser atingida, de ser presa por uma causa injusta (ou devo dizer inexistente), de até mesmo morrer; eu sorria. Sorria porque eu estava fazendo a minha parte como cada um ali estava... Infelizmente, muitos diriam que aquilo era inútil. Não que fossem contra, mas estavam presos a uma história que havia muito acontecera, semelhante a que agora "repetíamos". 
Talvez eu ousasse dizer que, sim, estávamos repetindo o que começou a ditadura e terminou onde estávamos, mas algo dentro de mim dizia que seria diferente. Por mais que dissessem que éramos um povo burro e que só estávamos caindo na ladainha dos políticos, eu pelo menos diria que tinha tentado... Diria "eu errei por uma causa nobre", e os céticos me responderiam "antes uma causa desonrosa do que um levante estúpido", e eu sorriria e olharia para o além "onde você estava?". Simplesmente, sem me importar com os testemunhos seguidos. 
Refugiei-me junto aos outros, que agora sentavam-se no chão e estendiam seus cartazes. Músicas de uma época semelhante a esta estavam marcadas em letras pintadas de guache, nomes famosos como Chico Buarque, Cazuza, Renato Russo e tantos outros eram trazidos a tona para mostrar que por mais que esta fosse uma nova revolução, os laços de cultura e nação não eram tão fáceis largados. Éramos todos um só, unidos por uma única bandeira e um único objetivo: direitos. 
Direito a uma educação melhor (Futebol: Brasil 10 x 0 Japão; Educação: Brasil 0 x 1000 Japão), a infraestrutura na saúde (Quando seu filho estiver doente, leve-o ao estádio!), transporte público digno de seu preço elevado (Ash roubou minha bicicleta, preciso de um transporte público de QUALIDADE) e tantos outros absurdos que um povo não poderia mais suportar. 
O hino nacional era entoado por 1 mihão de vozes, com suas devidas adaptações (Entre outras mil és tu Brasil a mais roubada...). Pessoas de cores, religiões, culturas, origens diferentes, todas juntas com apenas um objetivo, cantando em apenas um tom... 
Gritávamos em nossas entrelinhas: nós não somos o futuro da nação. Nós somos A nação. 
E, não importa mais o que façam, nós acordamos.